quarta-feira, 26 de novembro de 2014

REVELAÇÃO E INSPIRAÇÃO DAS ESCRITURAS SAGRADAS - A BÍBLIA


SOBRE REVELAÇÃO E INSPIRAÇÃO DAS ESCRITURAS SAGRADAS – A BÍBLIA

Revelação: A ideia clássica, evangélica e moderna é que o Senhor usou apenas um modelo de operação no processo de Revelação e Inspiração das Escrituras Sagradas. Mas estudos modernos mostram na Bíblia uma variedade de formas divinas de R-I. O próprio livro de Hebreus afirma, na sua introdução que “havendo Deus, outrora, falado muitas vezes (polumers) e de muitas maneiras (polutrops), aos pais, pelos profetas, nestes últimos dias nos falou pelo Filho” (Hb 1.1-2).

Estudiosos Adventistas têm reconhecido esta variedade e têm sugerido que ao modelo “profético” geralmente aceito devemos acrescentar a “pesquisa modelo” de revelação. Sugerem ainda, outros modelos de revelação como “testemunha”, “conselheira” “epistolar” e “literária”. Outros estudos devem ser feitos para avançar no conhecimento de como as agencias divinas interagem com as humanas para a geração do pensamento e informação bíblica.

Todavia parece claro que na produção das Escrituras, as agencias divinas e humanas interagiram, no mínimo, nos seguintes modelos: (1) Teofânico, Êx 3.1-5. (2) Profético, Ap 1.1-3. (3) Verbal, Êx 31.18. (4) Histórico, Lc 1.1-3. (5) Sapiencial, Ec 1.1, 12-14; 12.9-11. (6) Existencial, Lm 3.1.

Inspiração: Os profetas nos deixaram muita informação sobre as maneiras como as intervenções divinas ocorreram enquanto eles estavam comunicando suas mensagens nas formas oral e escrita. Parece que os escritores bíblicos recebiam as ideias e informação antes de se assentarem para escrever. Portanto, a função do Espírito Santo na inspiração não era primeiramente gerar pensamentos, mas assegurar a comunicação fidedigna da informação recebida. Quando Deus enviou Moisés para libertar Israel do cativeiro egípcio, a dupla Moisés-Arão trabalhou de maneira semelhante à dupla Deus-profeta. Moisés representava Deus ao “pôr as palavras na boca” de Arão. Arão falando por Moisés ao povo, desempenhava o papel de profeta. O ato de “pôr as palavras” na boca de alguém significava que o receptor tornava-se um representante subserviente de outro; o representante, porém, tinha a liberdade de representar. Tinha poder de procurador. A representação textual não faz sentido. Arão tinha acentuadas habilidades verbais, e Deus o chamou para usar o seu dom. Do mesmo modo, os profetas e apóstolos, como representantes de Deus, eram subservientes aos pensamentos divinos, mas os expressavam segundo seu entendimento e maneira de expressão.

Contudo, devemos ter em mente que na revelação o pensamento divino se adaptava às limitações e imperfeições dos processos de pensamento humano. Com a inspiração, o pensamento divino, já adaptado ao modo humano de pensar, ajusta-se aos modelos da escrita humana. Então, a maneira de pensar e de escrever que encontramos nas Escrituras não é divina, mas humana. “... Os escritores da Bíblia foram os instrumentos de Deus, não a sua pena” (1ME 21). Claro, isso não significa que o conteúdo das Escrituras é indigno de confiança. Significa apenas que não devemos esperar das Escrituras absoluta perfeição divina nos mínimos detalhes, como se Deus tivesse usado Sua maneira perfeita de pensar e escrever. O conteúdo verdadeiro gerado pela revelação torna-se expresso no modo imperfeito do pensamento e da escrita humanos. Por exemplo, os escritores bíblicos não tinham memória perfeita; eles esqueciam as coisas como nós. Não possuíam percepção sensorial perfeita. Não eram capazes de compreender toda a riqueza dos pensamentos e ideias divinos a eles revelados. Além disso, nossas palavras podem ter vários, mesmo contraditórios, significados diferentes, e assim por diante. Tudo isto é parte do modo humano de pensar e escrever que Deus usou ao revelar e inspirar as Escrituras.

A inspiração divina apagava ou anulava as imperfeições do modo humano de pensar e de escrever? Os inspiracionistas verbais acreditam que sim. Eu não compactuo com esta ideia. Deus usou nosso imperfeito meio de comunicação para revelar-se a si mesmo e sua palavra a nós. Na Bíblia, portanto, encontramos a verdade divina expressa em um imperfeito modo humano de comunicação. A direção do Espírito Santo não anulava o modo de pensar e de Escrever dos escritores bíblicos, mas supervisionava o processo da escrita a fim de maximizar a clareza das ideias e prevenir, se necessário, a distorção da revelação, ou a mudança da verdade divina em uma mentira. As Escrituras Sagradas apresentam um exemplo de uma forma de intervenção divina ocasional também usada pelo Espirito Santo como por exemplo no caso de Balaão (Nm 22.1-24.25). O episódio de Balaão não deve ser usado como modelo geral de inspiração divina como sugere a teoria verbal. Não deve-se aplicar o exemplo de Balaão aos profetas bíblicos. À essa altura, é necessário afirmar a total confiabilidade das Escrituras dentro dos parâmetros das limitações das limitações normais do pensamento e do processo linguístico humanos. Sendo que toda a Bíblia é revelada e inspirada dentro do nível do pensamento e linguagem humanos, ela não representa a perfeição divina; entretanto suas palavras nos revelam com segurança os pensamentos e a vontade de Deus. Tal visão explica por que certas discrepâncias e a ausência de absoluta precisão em matérias de detalhe que encontramos nos fenômenos das Escrituras não afetam a comunicação fidedigna dos conteúdos revelados.

Um Modelo Bíblico de Revelação-Inspiração. Esse modelo está baseado em Paulo (2Tm 3.16) e Pedro (2Pe 1.20-21).

O theopneustos de Paulo. Paulo fala que “toda Escritura é inspirada por Deus” (Gr. pasa graph theopneustos). Embora a palavra “inspiração” venha do equivalente latino divinitus inspirata, Paulo usa a palavra theopneustos que literalmente significa “Deus soprou” ou “soprada por Deus”. Entretanto não temos ideia plena acerca do que um “sopro divino” poderia significar quando aplicado literalmente à origem das Escrituras. Contudo podemos compreendê-lo metaforicamente. Assim compreendido, o texto diz que Deus está envolvido diretamente na origem das Escrituras, embora não explique o modo e pormenores da operação divina. Fica mais obvio entender que o Espirito Santo orientou todo o processo da geração das Escrituras.

O pheromenoi de Pedro. Pedro em suas observações sobre a origem das Escrituras nos fornece mais variações e análises. Declarando que “homens falaram da parte de Deus sendo dirigidos (pheromenoi, “sendo movidos”) pelo Espírito Santo” (2Pe 1.21), Pedro realça claramente o fato de que seres humanos escreveram as Escrituras sob a direção do Espírito Santo. Tanto Deus quanto seres humanos estiveram envolvidos na produção das Escrituras. Pedro qualificou cuidadosamente a intervenção de agentes humanos: “sabendo, primeiramente, isto: que nenhuma profecia da Escritura provém (ginetaí) de particular elucidação (epiluses) (2Pe 1.20). No contexto em que ele usa a palavra grega epilusis, Pedro está dizendo que mesmo quando seres humanos estavam envolvidos em em escrever as Escrituras, eles não originaram as explanações, exposições, ou interpretações dos vários assuntos ali apresentados.

Devemos entender a inspiração divina das Escrituras da qual Paulo, Pedro e outros contextos falaram, no mínimo, da seguinte maneira:

  1. “Direção” divina ou “movidos” agindo diretamente sobre a agencia humana no processo de Revelação e Inspiração.
  2. “Direção” divina ou “movidos” das agencias humanas seguiu as várias maneiras da providência divina operando dentro do fluxo dos eventos históricos, não como o atemporal, soberano e absoluto poder de Deus operando por meio de decretos eternos e anulando a liberdade dos escritores bíblicos.
  3. Deus guiou a recepção de informação e a formação de ideias nos escritores bíblicos por meio de um processo histórico de revelações divinas cognitivas dadas a eles em uma diversidade de modelos.
  4. A “orientação” divina e o “movidos” das agencias humanas adotaram modelos múltiplos de operações divinas, nos processos de revelação e inspiração (Hb 1.1) com acentuada ênfase sobre o primeiro. Esta ênfase permite a inclusão da dinâmica da inspiração do pensamento no modelo bíblico.
  5. Toda Escritura foi revelada e inspirada. Neste sentido, o modelo bíblico de Revelação e Inspiração é pleno, porque aceita a totalidade das Escrituras.
  6. A “direção” do Espírito Santo ou “movidos” utilizava-se da liberdade e habilidades literárias das agencias humanas em seu desenvolvimento histórico e espiritual. A anulação divina da agencia não era o principal modelo de “direção” divina ou “movidos”, mas um possível último recurso para evitar a má representação humana.
  7. Pelo fato de que a direção do Espírito Santo respeitava os modos humanos de pensamento e escrita, não devemos esperar encontrar nas Escrituras a perfeição absoluta que pertence unicamente à vida íntima da Trindade. Ao contrário, não nos devemos surpreender se encontrarmos nas Escrituras imperfeições e limitações que pertencem essencialmente aos modos humanos de pensar e escrever.
  8. Embora a “direção” e o “movidos” divinos operassem nas agencias humanas, por meio delas são atingidas as palavras das Escrituras. Neste sentido o modelo bíblico de R-I é “verbal”.
  9. A “direção” divina no processo da escrita não assegurava absoluta perfeição divina, em sua totalidade as Escrituras verdadeira e fielmente representam os ensinamentos, vontade e obras de Deus.

Em resumo: Deus e não os escritores humanos, é o autor das Escrituras no sentido de que ele é a fonte de conteúdo, ação e interpretação.

 

Este resumo foi feito do artigo Revelação e Inspiração do Dr. Fernando L. Canale.  REID. Compreendendo as Escrituras, pp. 47-74.

 
Por: Pr. Cirilo Gonçalves
Doutorando em Teologia
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