Palavra de Deus = lei e evangelho
Se perguntarmos a Lutero o que ele entende por palavra de Deus, ele nos responde que a Palavra de Deus é lei e evangelho. Quem não fizer essa distinção não poderá explicar corretamente a Escritura. Ambas as coisas devem permanecer, a lei e o evangelho, mas cada qual deve permanecer em seu devido lugar.
Para Lutero a
graça é uma qualidade que dá ao homem a força para executar as exigências de
Deus, as quais não pode cumprir em sua própria capacidade.
Cristo seria
então aquela dádiva de Deus, que coloca o homem em condições de realmente
realizar seus alvos inatos, morais e bons, não por força própria, mas pela
força de Deus. Evangelho é presente da graça de Deus entre nós. Onde se ensina
'deveis crer em Cristo' aí se executa em verdade a obra da lei. Pois é
justamente o sentido da lei, que com ela Deus quer tornar claro ao homem: 'tu
precisas de Cristo'. A lei exige a obrigatoriedade de termos o amor e Jesus
Cristo, mas o evangelho nos oferece ambos e os traz.
Essa clara
frase de Lutero, escrita com referência a Romanos 7:7, será durante toda a sua
vida por ele defendida e explanada. Ambos, a lei e o evangelho, têm o mesmo
conteúdo; lá ele é exigido, aqui ele é presenteado. Lá é dito: 'tu tens que ter
Cristo e seu espírito' – e em toda a parte, onde isso é o conteúdo da Palavra
de Deus, há lei, quer sejamos colocados diante desse postulado no Antigo ou no
Novo Testamento, quer nas palavras dos profetas ou do próprio Jesus.
Antinomianismo
Lutero divisa o
grande perigo de que em suas próprias fileiras seja desconsiderado o mandamento
máximo de sua teologia, a saber, a correlação e o inter-relacionamento de lei e
evangelho, a fim de que em aparente radicalidade, a qual em verdade não passa
de cegueira e incompreensão, entrar em vigor exclusivamente o evangelho,
exclusivamente a graça, exclusivamente a cruz.
Lutero luta em
favor do "e": lei e evangelho. Propugna para que não se invertam
ambas as grandezas ou, pior ainda, se exclua totalmente a lei. Pois por certo é
verdade que a lei só é compreensível a partir do evangelho. A seqüência,
portanto deve ser lei e evangelho.
Motivos Práticos para a Pregação da Lei
Lutero dá
ênfase que a lei deve ser pregada tanto aos descrentes como aos crentes. Aos
descrentes para que se convertam mudando assim sua maneira de viver, Aos
crentes pelo fato de que ainda carregam consigo vestígios do pecado. Eles ainda
não são piedosos, santos e bons, mas estão se tornando. Enquanto vivermos,
estamos em formação. Por isso, também para nós a lei é necessária. A disciplina
externa e interna de nossa vida é ainda – sua obra. Declara ele que a lei,
coloca freios em nossas inclinações e desejos. Somente anjos não têm mais
necessidade da lei, mas homens de carne e sangue – e nem mesmo os cristãos
estão disso excluídos – precisam, enquanto viverem, da lei.
Por que ainda
lei, se se concede que a lei não é necessária para a justificação? Não implica
isso mesmo a frase tão destacada por Lutero que o homem se torna justo sem as
obras da lei, somente pela fé? Vemos, portanto, como devemos perguntar adiante
e ir mais a fundo, se queremos compreender não somente sua imprescindibilidade
prática, mas sua determinação e necessidade divinas. Por que é ela necessária a
partir de Deus?
Perguntamos: há
realmente uma revelação de Deus na lei, assim como também há a sua revelação no
evangelho, ou não se encontra aquilo que chamamos de lei numa linha só com o
que chamamos de ordem política, social e natural da vida, no sentido de que
cada povo e cada estado têm sua ordem? Há, além disso, ainda a lei divina, uma
lei que é Sua lei, estabelecida por Deus, dada a partir do céu? Justamente isso
Lutero defende, justamente isso afirma contra os antinomianos, que querem
rebaixar a lei ao nível de ordem política. De fato, é um mandamento do céu,
isto é, não humano, não terreno, como o do imperador. Lutero assume o que Paulo
diz, a saber: a lei é santa, divina e boa; também a designa de espiritual,
querendo assim descrever sua natureza, Por isso pela fé tampouco é suspensa ou
ab-rogada a lei; ao contrário, a partir daí é plenamente colocada em vigor,
pois somente a fé cumpre a lei, presenteando o homem com um novo coração e um
novo espírito, que compreende a lei, que nela ama e adora a vontade do
Pai."
Assim Lutero
pode contrapor as mais agudas teses àqueles que desejam suprimir a lei da
revelação de Deus. É de opinião que esses "fanáticos", sob a alegação
de construir tudo sobre o sacramento e o exemplo de Jesus Cristo, em verdade
acabam assim suprimindo Cristo. "Pois se a lei é ab-rogada, então não se
pode mais saber quem é Cristo, o que ele fez, já que cumpriu a lei por nós.
Pois se quero compreender corretamente o cumprimento da lei, isto é, Cristo,
então é necessário saber o que é a lei e seu cumprimento. Isso, no entanto, não
pode ser ensinado, a não ser que se diga que a lei não está cumprida em nós,
sendo nós portanto devedores do pecado e da morte. Se isto é ensinado, então
aprendemos que todos somos devedores da lei e filhos da ira. Por isso, a
doutrina da lei é necessária na igreja e tem que ser mantida por princípio,
porque sem ela Cristo não pode ser mantido. Em suma: suprimir a lei e manter o
pecado e a morte, isso significaria praticamente esconder a doença do pecado e
da morte, para a destruição dos homens. Se morte e pecado foram subjugados
(como Cristo o fez), então a lei poderia muito bem ser aniquilada, mas ao
contrário é confirmada como está escrito em Romanos 3.
Lutero conclui
suas asseverações sabre o valor da lei sintetizando: "Ambas as doutrinas,
da lei e do evangelho, devem ser mantidas na igreja."
Nota: Estes pensamentos foram retirados do livro A Justiça da Fé, págs. 29-37, de Hans Joachin Iwand, uma Exposição conforme a doutrina de Lutero. Editora Sinodal, 1977.
Extraído do Livro: Leia e Compreenda melhor a Bíblia de Pedro Apolinário.
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