Os versos 21 a
23 do primeiro capítulo de Filipenses rezam assim na Edição Revista e
Atualizada no Brasil, de João Ferreira de Almeida.
"Porquanto,
para mim o viver é cristo, e o morrer é lucro. Entretanto, se o viver na carne
traz fruto para o meu trabalho, já não sei o que hei de escolher. Ora, de um e
outro lado estou constrangido, tendo o desejo de partir e estar com cristo, o
que é incomparavelmente melhor."
Fil. 1:23
aparece assim em diferentes traduções.
"Estou
cercado dos dois lados, pois quero muito deixar esta vida e estar com Cristo, o
que é bem melhor." – O Novo
Testamento na Linguagem de Hoje.
"Ás vezes
quero viver e outras vezes não quero, pois estou ansioso para ir e ficar com
cristo. Como seria muito mais feliz para mim do que estar aqui! – O Novo Testamento Vivo.
"Sinto-me
num dilema: o meu desejo é partir e estar com cristo, pois isso me é muito
melhor, mas o permanecer na carne é mais necessário por vossa causa." Fil.
1:23-24 – A Bíblia de Jerusalém.
Satanás, com
seu acendrado espírito de rebelião, tentou muitas vezes exterminar as
Escrituras Sagradas; porém, vendo que seus esforços foram infrutíferos, passou
a usar de outros processos ardilosos, como este: torcer o sentido das palavras
ou das idéias da Bíblia para que se ajustem aos seus enganos. Um exemplo bem
frisante deste método se encontra no processo interpretativo de Fil. 1: 23.
O argumento
mais ponderável dos que crêem na imortalidade da alma, é dizerem que a Bíblia
esposa esta idéia, citando entre outras passagens esta de Paulo, onde afirmam
eles, o apóstolo declara que para ele o morrer é lucro, porque assim estaria
imediatamente com Cristo, gozando das delícias eternas.
O Comentario del Nuevo Testamento de Louis Bonnet e Alfredo Schroeder, vol. 3 diz a este respeito:
"Para estar com Cristo, prova evidente de que Paulo esperava esta
felicidade imediatamente depois de sua morte."
O pensamento
paulino neste sentido é bastante claro e as passagens de I Cor. 15; I Tess.
4:16-18; II Tim. 4:8; Rom. 8:23 não deixam dúvidas de que ele não cria numa
recompensa incorpórea e imediatamente após a morte.
É princípio fundamental
da exegese, que a Bíblia não se contradiz, e que um texto deve ser explicado
através do conjunto das Escrituras e não isoladamente. Logo, sendo Filipenses
1:23 uma passagem controvertida, ela tem de harmonizar-se com outras passagens
paulinas e com a doutrina geral da Bíblia concernente ao estado do homem na
morte.
Há muitas
outras passagens bíblicas, que comprovam a crença de Paulo quanto ao estado do
homem na morte, e de que a recompensa só será uma realidade quando Jesus
voltar. S. João 14:1-3; Atos 2:34; Heb. 11:39; Apoc. 14:13; Ecl. 3:18-21;
9:5-6.
Walter R.
Martin, no livro The Truth About Seventh Day Adventism,
apresenta Filipenses 1:21-23 como contestação à doutrina adventista da
imortalidade condicional e da destruição dos ímpios, afirmando que a Bíblia
ensina a existência consciente depois da morte, e o tormento eterno dos
incrédulos.
Em artigo
inserto no Ministério Adventista, Maio/Junho de 1965, pág. 9, o Pastor D. E.
Mansell refutou as idéias apresentadas pelo nosso oponente. Parte delas serão
transcritas para este trabalho:
"Chegamos
agora a Fil. 1:21-23. Novamente o Sr. Martin afirma o que devia ter provado,
isto é, que Paulo 'desejava partir de seu corpo e desfrutar espiritualmente a
presença de seu Senhor' (pág. 124). Nosso amigo pode pensar que Paulo almejava
sair de seu corpo e ir a presença de Cristo como uma entidade espiritual, mas
como ele compreende bem 'a Bíblia não diz assim' (Pág. 122).
"Não é por
obstinação que os adventistas insistem que 'a Bíblia não diz assim', mas pela
simples razão de que esta passagem das Escrituras nada declara sobre deixar o
corpo e desfrutar espiritualmente a presença do Senhor. Além disso, cremos
haver sólidas razões, no contexto, para assumirmos esta posição, a despeito das
afirmações do Sr. Martin.
"É curioso
que embora o Sr. Martin dê grande ênfase à construção gramatical de Fil. 1 23,
que alega ser 'gramaticalmente devastadora para a posição dos adventistas do
sétimo dia', passa por alto o contexto e a exegese da passagem sob consideração.
Ora, nem por um momento admitimos que a construção gramatical da frase 'partir
e estar com cristo, o que é incomparavelmente melhor', seja devastadora para a
nossa posição. Pelo contrário, cremos ser ela devastadora para a posição do Sr.
Martin, pelo simples motivo de que a passagem não diz coisa alguma sobre partir
do corpo e desfrutar espiritualmente a presença do Senhor, o que, aliás, o Sr.
Martin procura provar.
"Ademais
ele desconsidera significativamente certas porções do contexto em que esta frase
é encontrada. Na frase precedente o apóstolo Paulo declara estar 'em aperto'
'de ambos os lados'. O contexto torna bem claro que por esses dois lados Paulo
quer indicar a 'vida' e a 'morte'. Portanto, o aperto em que ele se encontrava
era escolher entre a vida e a morte (versos 21 e 22). Ora, segundo a opinião de
Walter Martin, o crente 'nunca pode experimentar perda de comunhão do
companheirismo como entidade espiritual, embora seu corpo possa morrer' (pág.
121). Conseqüentemente, de acordo com essa teoria, quer Paulo vivesse ou,
morresse, a 'comunhão de companheirismo permaneceria inalterada'. O Sr. Martin
insinua que como Paulo desfrutava comunhão com Cristo na vida, continuaria a
gozá-la depois da morte, encontrava-se num dilema. Esta conclusão seria lógica,
não fora o fato de Paulo desejar algo 'que é incomparavelmente melhor' (verso
23). Melhor do que o quê? Obviamente muito melhor do que a vida ou a morte. Que
era isto? Paulo diz que era partir e estar com Cristo (verso 23). Sendo que
partir para estar com cristo é melhor do que a vida ou a morte, é evidente que
a morte não conduziria à 'presença de seu Senhor' (Pág, 124), como afirma o Sr.
Martin.
"Os
Adventistas do sétimo Dia crêem que Paulo está se referindo aí à trasladação,
isto é, ser lavado corporeamente para o céu sem provar a morte, como Enoque
(Heb. 11:5), Elias (II Reis 2:11) e como sucederá com os santos que estiverem
vivos por ocasião do segundo Advento (I Tess. 4:17). Isto seria de fato
'incomparavelmente melhor' do que a presente vida ou a morte. Transportaria
Paulo da anual condição mortal para a condição final, sem que passasse pela
morte."
Vincent, após
mencionar a expressão "estar com cristo" de Fil. 1:23, leva-nos a
comparar este texto com I Tes. 4:14-17, onde Paulo coloca o estar com Cristo
para o tempo da ressurreição, por ocasião da Segunda Vinda de Cristo.
Os adventistas
cremos que as duas afirmações "partir e estar com Cristo" não
pressupõem dois acontecimentos imediatos ou em seqüência.
Haverá base
bíblica para esta crença?
Sim, e os dois
seguintes exemplos confirmam nossa assertiva:
1º) Em Isaías
61:1-2 há uma profecia da obra que Cristo efetuaria em seu primeiro advento. Em
S. Lucas 4:17-19 se encontra o relato de que cristo leu esta passagem, acrescentando,
no verso 21: "Hoje se cumpriu esta escritura em vossos ouvidos".
Atentando para o relato de Isaías, veremos que Cristo não leu toda a profecia,
embora seja uma declaração aparentemente ligada; Ele concluiu com a frase:
"e anunciar o ano aceitável do senhor". A frase seguinte diz: "e
o dia da vingança de nosso Deus". Ele não leu esta parte, porque não devia
cumprir-se naquela época, embora estivesse unida na mesma frase. Toda a era
cristã devia passar antes de vir o dia da vingança do nosso Deus.
Conclusão
O Comentário Adventista ao analisar Fil. 1:23 assim se
expressa:
"Estar com Cristo. Paulo não está aqui
apresentando uma exposição doutrinaria do que acontece na morte. Está
explicando o seu 'desejo', que é deixar a presente existência; com seus
problemas, e estar com Cristo sem referir-se a um lapso de tempo que possa
ocorrer entre os dois eventos, com toda a força de sua ardente natureza ansiava
viver com Aquele a quem ele fielmente servira, sua esperança se centraliza num
companheirismo pessoal com Jesus por toda a vida futura. Os cristãos primitivos
de todas as épocas tiveram este mesmo desejo, sem necessariamente esperarem ser
imediatamente introduzidos à presença do Salvador, quando seus olhos se
fechassem na morte.
"As
palavras de Paulo aqui devem ser consideradas em conexão com suas outras
afirmações, onde ele claramente se refere à morte como um sono (I Cor, 15:51; I
Tes. 4:13-15). Desde que não há consciência na morte, nem consciência do
período de tempo, a manhã da ressurreição parecerá como acontecendo logo após a
morte".
Extraído do livro: Explicação de Textos Difíceis da Bíblia de Pedro Apolinário
Adaptação, Didática e Grifos de
Pr. Cirilo Gonçalves da Silva
Mestre em Teologia e Evangelista
Twitter: @prcirilo
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